Dás-me a tua almofada para dormir, porque sabes que gosto de almofadas altas. Não foram assim tantas noites (ou pelo menos não tantas quanto gostaríamos os dois), mas sabes desde a primeira. A t-shirt está ao fundo da cama, dobrada, para mim, como se me esperasse contigo. Alternas entre o ar atrevido e o olhar envergonhado e eu perco-me entre os dois. Gosto dos dois. Procuro os dois. E depois encontro-te a ti. As tuas mãos que me tocam suavemente como se só existisse o agora, e o agora fosse um tempo para sempre. E contigo é. Cada agora é um para sempre. Porque nunca pensamos em futuro. A falta de vontade de denominar e assumir o que não precisa de existir, faz-nos pender nas linhas dos instantes e vivemos no segundo presente. Sem ontem. Sem amanhã. E sem me aperceber só te quero tocar, agarrar, puxar-te para mim, ter-te dentro de mim. No final, cedo aos instantes e adormeço com vontade de te abraçar. E o meu braço abraça-te. Mas a vontade é diferente do que se faz. E a vontade às vezes quer coisas diferentes do corpo.
Pouco durmo. Sempre foi assim. Sozinha também, mas acompanhada é pior. Acho que o meu coração nunca se habituou ao compasso duplo. E, por isso, em segredo, vejo-te dormir. Não era suposto entre nos, eu sei. Nem sempre sou boa a cumprir regras e, na verdade, nunca escrevemos as nossas. Dás-me vontade de te querer e medo de te querer. E este paradoxo resolve-se no dia seguinte quando acordas e sei que te tenho, mas não te tenho. E, pela primeira vez, não quero querer saber se terei. Quero os nossos instantes, secretos, em que somos amantes sem o ser. Vou para casa e a vida corre. Natural e desprendida, tal e qual como ela própria deve ser. Ninguém sabe a razão do meu sorriso. Nem tu. Não tens que saber.